OS CAPOEIRAS: REPRESENTAÇÕES NA IMPRENSA E NA INTELECTUALIDADE DO SÉCULO XIX
Samantha Eunice de M. Marques Pontes
Biblioteconomia e Documentação (UFF) e Mestranda em Memória Social da Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro (UNIRIO)
E-mail: pegui@click21.com.br
...........Assim, era através do corpo e dos gestos que primeiro se conhecia o capoeira que atraía a atenção dos expectadores acidentais ou fiéis que o observavam em suas rotineiras atuações temidas e admiradas nas ruas da cidade. Palavras como “ajuntamentos” ou sinônimos estão constantemente relacionadas nas narrativas sobre as ações dos capoeiras, e demonstram que havia interesse popular pelas suas performances. A insistência das ações dos capoeiras, a despeito da forte repressão das autoridades e a forja de seu corpo fora dos padrões institucionais da época, são fatores que podem dar conta do mito da resistência que a capoeira representa até hoje.
APRENDIZ DE CAPOEIRA. Anteontem divertia-se o menor Antônio Soares de Araújo em exercícios acrobáticos de agilidade, que o vulgo chama de capoeiragem. O campo de exercícios era o largo da Sé, onde o rondante, não apreciando aquela cena, levou Antônio para a Primeira estação da Guarda Urbana.
Diário do Rio de Janeiro, 05 março 1872.
A repressão policial à prática da capoeira é descrita na nota acima publicada na segunda metade do século. Apesar de não estar aparentemente envolvido em nenhuma situação de conflito, o dito “aprendiz de capoeira” representa uma ameaça que deve ser combatida imediatamente. ...........
Na divisão simbólica do território da cidade percebe-se a marca do capoeira, que caracteriza os lugares com o estigma da desordem e do perigo, conforme relata a citação anterior. No entanto, a capoeiragem carioca constitui-se como uma organização tão hierarquizada quanto um grupamento militar, onde se destacam mestres e discípulos que se graduam de acordo com suas habilidades corporais testadas nas ações praticadas nas ruas. Tal hierarquia era reconhecida tanto pelos capoeiras quanto pelo restante da sociedade, que acompanhava suas façanhas nos constantes noticiários.
Apesar da proibição, era na rua, à vista de todos, que se processava o ensino da capoeira. E mesmo sendo coibido num dia, retomava dias depois no mesmo lugar. Esses lugares onde acontecia o treinamento dos novos capoeiras eram conhecidos e numerosamente freqüentados.
"Parece averiguado que o Largo da Sé é o campo escolhido para os recrutas da arte. Ontem às duas horas da tarde José Leandro Franklin, veterano experimentado e o noviço Albano, aquele ensinando, este aprendendo as artes e agilidades da capoeiragem, foram surpreendidos nos seus estudos pelos guardas urbanos, que mudaram-lhe o curso para o xadrez da polícia. À preleção de Franklin assistiam muitos colegas, e talvez aspirantes, mas estes infelizmente evadiram-se "
Jornal do Comércio. 11 março 1872
http://www.unirio.br/morpheusonline/numero07-2005/samantha.htm
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