ANGELA TEREZA DE OLIVEIRA CORREA*
A VIDA NOTURNA EM BELÉM: A BOÊMIA POÉTICA 1920/1940
Universidade Federal do Pará/Núcleo Pedagógico Integrado
Na década de 1920, jovens literatos boêmios costumavam se reunir no terraço do Grande
Hotel, no Largo da Pólvora11:
À noite, no terraço do Grande Hotel, debaixo de copadas mangueiras, reuniam-se os grupos habituais. O círculo de conhecidos ia se alargando. Emendava-se, às vezes, com outras rodas. Vinham o Braguinha, o Proença, o Orlando, Clóvis de Gusmão, o Abguar Bastos, ás vezes Nunes Pereira. Discutia-se de tudo. Entravam em comentários os fatos correntes, fofocas, anedotas. (...)12 Outros literatos boêmios reuniam-se pelos “botecos do Ver-o-Peso. Deste grupo, mais
modesto, participavam Paulo de Oliveira, De Campos Ribeiro, Ernani Vieira, Muniz Barreto, Arlindo Ribeiro de Castro, Lindolfo Mesquita, Sandoval Lage e Rodrigues Pinagé13 que pelos
botecos do Ver-o-Peso, bebiam cachaça de 500 réis a dose acompanhada de posta de peixe frito
de 200 réis e farinha d'água de 10 tostões o litro.14
Os dois grupos, apesar das diferenças sociais, que parecia separá-los, pois alguns faziam parte das elites locais, tendo podido freqüentar faculdades do Rio de Janeiro e São Paulo, enquanto outros provinham de famílias mais humildes, comungavam de idéias e projetos de uma cultura "nacional" e "regional". Suas idades variavam entre 16 e 40 anos, é mesmo possuindo os mais diferentes credos estéticos, mantinham, entre si, uma constante integração. O desejo de produzirem uma “cultura nacional”15, baseada nos elementos da “cultura popular” foi capaz de uni-los, assim como as noites de diversão, já que parecem terem sido freqüentes as escapadas de vários integrantes do grupo do Grande Hotel em noitadas suburbanas, onde exercitavam poesia, política e vida amorosa16.
11 FIGUEIREDO, Aldrin Moura de. Eternos modernos: uma história social da arte e da literatura na Amazônia, 1908-1929. São Paulo: UNICAMP/ Tese de Doutorado, 2001. (mimeo), pág. 219.
12 RAUL, Bopp. Belém em 1921. Citado por FIGUEIREDO, Aldrin Moura de. Obra cit. pág. 219.
13 FIGUEIREDO, Aldrin Moura de. obra cit. pág. 220.
14 ROCHA, Alonso Et. All. Bruno de Menezes e a sutileza da transição. Belém: Cejup. Pág. 14.
15 Nas décadas de 20 e 30 do século XX, os intelectuais brasileiros estavam repesando o Brasil. Uma das principais questões focalizadas os levou a refletir sobre as bases para a construção de uma identidade nacional independente de modelos, valores e pensamentos provenientes da Europa, neste momento vista como ultrapassada e decadente, devido às destruições e perdas sofridas durante a Primeira Guerra Mundial. Os elementos que comporiam a cultural nacional, identificando a nação, deveriam ser procurados no interior da cultural popular. Neste sentido o popular torna-se o lócus da autenticidade. OLIVEIRA, Lucia Lippi. A Questão Nacional na Primeira República. In: A década de 1920 e as origens do Brasil moderno. (Orgs) LORENZO, Helena Carvalho de. & COSTA Wilma Peres da. São Paulo: UNESP, 1997, p 185/193. Na década de 1930, sob a égide do estado Varguista, a política cultural implantada procurou inviabilizar as múltiplas práticas culturais existentes no interior da sociedade brasileira que destoavam do conceito de cultura nacional e popular que se desejava implantar. Assim a cultura foi colocada sobre a tutela do Estado definindo-se enquanto “matéria oficial” e o esboço de um projeto de nacionalização paternalista que promovesse a elevação cultural do povo. MENDOÇA, Sônia Regina de. As Bases do Desenvolvimento Capitalista Dependente: da Indústria Restringida à Internacionalização. In: História Geral do Brasil. (Org) LINHARES, Maria Yedda. 9ª Ed. Rio de Janeiro: Campus, 1990, p.344/347.
16 FIGUEIREDO, Aldrin Moura de. Obra cit. pág. 220.
http://www.anpuhsp.org.br/downloads/CD%20XIX/PDF/Autores%20e%20Artigos/Angela%20Tereza%20de%20Oliveira%20Correa.pdf
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